Saímos cedo, umas 17:00, e como a regra ditava logo esquecemos as circunstâncias. A batida na porta do carro para fechar veio antes mesmo do primeiro olhar. Depois, todo um caminho tortuoso, cheio de semáforos, pedestres desastrados e pedidos apagados de adeus, tomou conta daquele microespaço entre você e eu.
Eu fingi não me importar, atuei como sempre e desativei os sentidos com o intuito de que o silêncio ensurdecedor parecesse manifestação natural das coisas. Ao passo em que as primeiras perguntas triviais vieram, as respostas automáticas estavam rotineiramente na ponta da língua. Ufa.
Descemos. Primeiro você. Diante daquele bar, finalmente percebemos a chance de algum tipo de conectividade, aliada à permissão e à sustentação provida por copos e mais copos de cerveja e alguns cigarros frequentes. Os julgamentos ficariam apenas num plano subjetivo, não precisariam se transformar em outdoor nas nossas reações.
Começamos uma conversa bastante simples. Falamos primeiramente sobre os pequenos problemas no trabalho que todo mundo tem, depois as arestas familiares que todo mundo tem a obrigação de tentar aparar, e por fim os gastos, dívidas, apertos, convenientes para acreditarmos que os nossos entreveres são tão inéditos quanto o alívio, a surpresa e o desgaste desses instantes.
Depois de um tempo, a ocasião unida a algum tipo de erupção nos deu o privilégio de papear algo mais profundo, que dissesse diretamente ao momento emergente, e que regasse plantas e alimentasse aquários daquele dia. Nem sei como exatamente começou (a gente nunca sabe o disparo de algo importante assim), mas de repente, todo um possível texto-desabafo que poderia servir para um post deste blog começou a virar diálogo cheio de ácido sulfúrico.
O tom aumentou, e aumentou, e as pessoas das mesas ao redor já observavam aos cochichos, os garçons evitavam chegar perto e torciam apenas para que objetos não fossem atirados e atingissem os demais clientes. Mínima importância. O fato é que, até então, tinha engasgado de meu próprio receio de perturbar durante não sei quantos meses, aliás acho que anos, aquele relacionamento que mais parecia uma dor crônica. E o surpreendente para mim é que ela padecia de semelhanças, até no maior asco ou no menor vício.
Não entrarei nas minúcias do que virou alvo e artilharia. Mas é na morte que a gente se revela, e é na destruição que conseguimos compadecer daquilo que somos. Eu discuti como quem enfia dois dedos na garganta. Certo de que teria alívio. Tive mais. Tive, na mesma medida, perda e cura.
terça-feira, 24 de novembro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
4 comentários:
...considere-se abençoado por tê-los na mesma medida. Tantas escolhas erradas provenientes do prendizado me fazem ter mais perda do que cura...
sim, é na morte que a gente se revela.
E parece mesmo que certas coisas precisam explodir, jorrar e doer até serem reveladas como realmente são.
texto muito bom!
adorei aqui.
li morfina. amei.
Postar um comentário