domingo, 27 de julho de 2008

Peixe grande ou lambari?

De Daniel Ramos.

Parando para analisar, não me considero um cara preconceituoso. Claro, não existe uma pessoa 100% sem preconceitos. Todos nós, por vezes, julgamos pela capa ao invés do conteúdo, é próprio do ser humano. Comecei tocando nesse assunto tão delicado para relatar dois exemplos de experiências distintas dentre muitas desse tipo que já vivi, mas que ilustram bem o título desse post.
Começo por uma festa meio high society a qual fui convidado. Em primeiro lugar meu traje esporte fino já começou uma derradeira desgraça, pois como não tinha um sapato que combinasse, acabei usando um all star preto e usei tinta nanquim para cobrir a marca. A única camisa social que tinha a mão era uma azul-cobrador de ônibus, mas na “falta de azeitona eu utilizo bala de goma verde” e rezo pra Deus tenha pena da minha dignidade.
A festa extremamente bem decorada, com uma iluminação de muito bom gosto e uma mesa de buffet que devia ter petiscos de uns onze animais diferentes, alguns até extintos. Os contratados da festa sempre muito solícitos, mesmo quando era para tentar me explicar o que era aquele brulée de carnard, e todo o tipo de guloseima, que sinceramente algumas eu achei que eram de borracha. As pessoas extremamente refinadas, delicadas... As mulheres desfilando seus belos longos e os homens se esgueirando em suas becas comportadas, ao passo que eu parecia um holofote azul bebê no meio daquele mar de cores quentes e neutras. Agora eu mesmo me pergunto "que diabos eu fui fazer nessa festa?".
Respondo: Aniversário de vinte anos da filha da minha ex-chefe da época. Pois é, acho que minha ex-chefe foi a única pessoa com a qual falei por uma distância de menos de vinte centímetros. Minto, o segurança que me apalpou na entrada foi a maior prova de carinho que tive durante a noite. Enfim, passei a noite incólume e acho que nem se fingisse um ataque epilético alguém se atreveria a olhar para meu corpo semi-moribundo. Acabei a noite em casa, assistindo o dvd de Smallville, mas não sem antes colocar um pouco daquele brulée de carnard no bolso da minha camisa de cobrador.
A título de comparação e para assim encerrar a idéia a qual me propus a escrever, vou descrever outra festa, dessa vez mais recente, a qual fui convidado. Na contramão do que foi a primeira, essa foi como se fosse o negativo da foto, o Yin do Yang da corrente. Pra começo de conversa, esse regozijo coletivo foi num beco no meio de Mongaguá, mas como fui de carona, não reclamei da distância. Um casa simples, nada de glamour, sem as luzes da outra, tampouco a farta mesa de buffet. De fato, em substituição a essa duas, tivemos uma luz roxa que com certeza foi roubada de algum motel de beira de estrada e uns quinze ou vinte bem casados que as tias gordas se estapeavam para pegar. A música como sempre algo de primeira, MPB legítima, afinal é sempre bom revisitar os clássicos como “Adocica” ou então remexer o esqueleto ao som de pérolas modernas como “ele não monta na lambreta”. Os diálogos nas rodinhas de conversa eram algo de fazer Vinícius de Moraes se inspirar na hora: “Nossa princesa que perfume é esse? É Vagabunda de Cais da Natura!!”
Apesar de todo esse aparato tecnológico, o fenômeno foi inverso ao dão primeiro festejo, pois mesmo com os parcos recursos, as pessoas ali fizeram o máximo para que eu me sentisse bem, e olha que dessa vez fui de penetra e teoricamente era mais um na briga dos bem-casados. Me senti bem melhor recebido e o fato de não usar a camisa de cobrador ajudou se bem que o dono da casa tinha uma igualzinha escrita CMTC (maldito copião) .
Assim, me fiz a pergunta: o que é melhor? Ser um lambari num lago cristalino, ou um peixe grande num pequeno riacho? Não que sinta inferior ou superior a ninguém, mas parece que determinados ambientes tem o poder de mexer diretamente com a nossa auto-consciência, e embora passemos mais tempo tentando ser o que não somos, esses acontecimentos nos mostram o quanto ainda estamos longe de encontrar nosso meio ideal.

3 comentários:

Vini Noronha disse...

hahaha animais extintos foi foda.. Pelo menos você não foi em festas cujo cicerone atendia pela alcunha de "Talibã" e, dentre os ilustres convidados, figurava um ex-combatente da Farc e uma donzela que arrancaba as tampinhas das ampolas com os dentes.

Adriana disse...

"Tá que tá ficando
ficando muito legal
nosso amor é veneno
veneno do bem e do mal,ôôôô"

Adorei, parabéns pelo texto, Daniel!!

Unknown disse...

Valeu Adriana...obrigado pelas palavras. Vini essa festa Talibã foi coisa do outro mundo,heehhe