segunda-feira, 21 de julho de 2008

Procurando Nemo.

De Sergio Faria.

Há alguns meses atrás li numa edição da revista da MTV uma matéria sobre casais que transformaram o que poderíamos chamar de "amor impossível" em final feliz. Na tal matéria, tinha a história da moça que por solidariedade resolveu escrever cartas de apoio pra um presidiário que era irmão de uma amiga. Acabou se apaixonando depois que foi visitá-lo e hoje, apesar da falta de apoio da família e das amigas e do constrangimento ao passar pela revista no dias de visita, encontra com ele duas vezes por mês e encara tudo numa boa. Diz que o que vale é o que um sente pelo outro e o que estão vivendo no momento. Tem a história de uma baiana que namora um suíço há dois anos e meio mas só o encontra de quatro em quatro meses quando um dos dois voa para o país do outro. Como rola muito telefone e e-mail, ela diz que sempre sabe onde ele está, quais problemas tá passando e que ele é muito mais presente na vida dela do que muitos casais. Tem também a história da boxeadora que namora com um argentino nas mesmas condições que a baiana e o suíço. Cada um no seu país, estão sempre pedindo demissão de seus empregos pra se encontrarem. Outro casal apaixonado da matéria: a publicitária loira de 25 anos com um instrutor de capoeira de 18 anos. Mesmo com a reprovação dos amigos e a represália da família, ela não se abalou e levou o relacionamento adiante. Tá feliz e diz que apesar da idade ele sempre foi mais maduro que ela. Tem também a história da socialite de uma tradicional família milionária e judia que se apaixonou por um sujeito católico que era o segurança do avô. Ele foi demitido e ela banida da família. A vida dos dois sofreu uma reviravolta: ela abriu mão da herança e largou a mordomia. Já ele virou madrugadas chorando ao ter que deixar os dois filhos do primeiro casamento, mas não se arrependeu. Disse que por ela faria tudo de novo. Hoje dividem as contas e são felizes.

Achei todas as histórias interessantes e o lance do sentimento muito bonito. Mas acho tão complicado quando a distância atrapalha. Sempre critiquei esse tipo de relacionamento. Quando um amigo meu me disse que tinha arrumado uma namorada em Minas Gerais e um outro amigo me contou que tava com uma gaorta de Araraquara, perguntei a eles se valia mesmo a pena alimentar uma coisa tão cara e difícil, que tinha poucas chances de dar certo, de ter um futuro. Acho que é pedir pra sofrer. Hoje em dia já acho que cada caso é um caso e que só mesmo quem tá envolvido pode entender bem e aceitar esse tipo de namoro. E às vezes a distância não é o problema. Tenho uma aluna que namora há dois anos com um enfermeiro e, apesar dele morar no mesmo bairro, se encontram muito pouco. Como ele faz pós-graduação, trabalha por escala e tem muitos "compromissos", não tem muito tempo pra ela. Quando se encontram de quinze em quinze dias ou uma vez por semana, ela vai pra sua casa e junto com a sogrinha assistem fitas de vídeo. Puta que o pariu! Eles ficam sem se ver um tempão e quando se encontram vão ver filmes no sofá da sala. E o pior é que durante as minhas "aulas", ela se abriu comigo e contou que tava mal, muito deprimida por causa do pouco tempo que ficava com ele. Quando ela me contou isso fiquei cabreiro e comecei a botar pilha dizendo que talvez ela gostasse mais dele do que ele dela, e que talvez ele tivesse outra pessoa. Ela concordou comigo mas disse que o amava muito. Não me conformei com sua tristeza e questionei seu sentimento. Lembrei de uma letra do Cazuza que diz "se todo alguém que ama, ama pra ser correspondido e se todo alguém que eu amo é como amar a lua inacessível, então eu não amo ninguém. Parece incrível, não amo ninguém e é só amor que eu respiro". Depois que ela ouviu esses versos seus olhos lacrimejaram. Fiquei comovido mas disfarcei. Falei pra ela ficar a vontade e ela chorou copiosamente. Lhe perguntei como podia uma menina tão legal, bonita, inteligente e meiga continuar com uma pessoa que não lhe dava valor e a fazia sofrer daquele jeito (tô falando tudo isso baseado nas várias coisas que ela me contou). Tamanha era a sua carência e libido que ela chegou a comentar que trairia o seu namorado e até iria pra cama com alguém que não tivesse nome, endereço, história... Brincadeira? Como ela tava desempregada, não tá estudando, não tem muitos amigos e sua família é muito complicada, sugeri que procurasse passear mais, ir a lugares públicos, shopings, ir em eventos gratuitos (ela tá desempregada, lembra?), enfim, se expor mais. Assim talvez conhecesse pessoas legais pra fazer amizades e quem sabe até um carinha legal pra fazer com que ela desencanasse do enfermeiro bunda mole.

Me falando de como eram seus momentos com ele, disse que pra "variar" no último final de semana assistiu "Procurando Nemo". Adorou o desenho e se divertiu muito. Mas me confessou sem o menor pudor que o que ela queria mesmo naquele dia era "procurar o Nemo". Coitada. Ficou chupando o dedo. É foda! Ou melhor, não é. Ela conseguiu arrumar um emprego recentemente mas continua com o comédia. É aquela coisa: é melhor ser fanho do que não ter nariz. Ou seja, é melhor ter alguém assim do que não ter ninguém. Mas pensando bem e analisando com calma, talvez eu esteja errado ao questionar sentimentos, criticar meus amigos, estranhar algumas relações. Talvez eu não esteja preparado pra entender o que essas pessoas sentem. Talvez todas essas pessoas, as da revista, os meus amigos e a minha aluna, estejam amando realmente. Não o amor banalizado que a gente usa no dia a dia como "eu amo essa música" ou "dedico com todo amor" ou ainda "fiz esse trabalho com muito amor"; mas o amor verdadeiro. Mas o que é o amor verdadeiro? Sinceramente não sei. Mas eu acredito que amar seja mais do que pensar em alguém, se preocupar com alguém ou querer bem. Amar pra mim talvez seja o que essas pessoas estão fazendo: sofrendo, tentando, enfrentando diferenças, medos, preconceitos, distância... É não se satisfazer com um e-mail ou um telefonema. É querer estar junto sempre. É querer compartilhar momentos com conversas onde se quer saber tudo do outro, o que viveu desde a primeira infância até hoje de manhã. É querer compartilhar momentos de carícias onde se quer mapear o corpo do outro até decorar todas as cicatrizes e sinais de nascença dele. É enfrentar a tudo e a todos pra se ter tudo isso. Acho que amar é se anular (sem auto-destruição), acordar às 8 horas da manhã (no meu caso), cortar o braço se for preciso. Acho que quem ama mesmo morre pelo outro.

4 comentários:

Vini Noronha disse...

"Amar é não ter que pedir perdão."
- filme tosco dos anos 70

Adriana disse...

"O coração tem razões que a própria razão desconhece."

- Não sei quem disse isso.

Heloísa Noronha disse...

Concordo, Sergio. Sem convivência, a imagem das pessoas se torna idealizada. É muito lindo e romântico viver no mundo da fantasia, mas a realidade, apesar de algum perrengue ou outro, é muito melhor.

Anônimo disse...

De acordo comigo mesmo,"Namoro a distancia, felizes os quatro."