sábado, 4 de outubro de 2008

Identidade.

Por ???

Hoje eu tenho uma revelação a fazer. Coisa que vinha guardando comigo há muito tempo e, sinto, chegou o momento de fazê-la. Não posso mais enganá-los. Vocês já repararam que meu estilo de escrita vem mudando com o tempo, conforme canso de ostentá-lo. Escrevo desta forma, irônica e abusiva em argumentos, para fugir do que sou: sentimentalista, poético, filosófico. Meu nome não é Felipe, e meu apelido não é Grilo. E não sou este moleque de 20 anos. Isso foi uma identidade que desenvolvi para escrever sem ser criticado, perseguido, atormentado pelas autoridades.

Eu sou Renato Russo. Na verdade, Renato Manfredini Júnior, nascido no Rio de Janeiro em 27 de março de 1960. Enfim. Tudo o que escrevem a meu respeito na Internet é verdade, a não ser pelo factóide seguinte: Não morri de AIDS, como meus inimigos sugerem. Estava só com uma gripezinha. Mas como tive de ser afastado da fama por causa das merdas que sabia a respeito do governo, dizer que estava com AIDS veio a calhar. Merdas que vou deixar para comentar no texto seguinte.

Logo após o enterro de um boneco de cera, sumi para as ilhas canárias, onde fiquei recluso e aprendi os princípios da Ayurveda para elevar minha alma. Fiz uma plástica para rejuvenescer uns anos, sem muito sucesso, claro. Não consegui abandonar a barba e o jeito... hm... peculiar de dançar por entre as árvores. Emagreci e consegui ficar até menor em estatura, o que exigiu algumas operações ósseas e muita fisioterapia. No entanto, a mudança mais difícil de identidade foi abandonar a vodka. E sex pistols. E os filósofos como Hegel, a poesia russa, as leituras sobre política. E, principalmente, mudar completamente meu estilo de escrever.

Aliás, não apenas mudar, como piorar. Tive de abandonar o lirismo, a observação da vida por meio da sua essência, a voz que falava diretamente aos corações dos jovens, e o estilo que me consagrou como um dos maiores e mais valorosos poetas da minha geração. Para escapar do regime militar de uma vez por todas, joguei no lixo refrões cheios de niilismo e que falavam de inseguranças emocionais daquela geração. Versos que até hoje, por algum motivo, falam com muitas pessoas até hoje.

Fiquei com essa escrita medíocre em prosa, que fala das coisas mundanas e faz observações amadorescas sobre a realidade oculta das pessoas. Foi o máximo que consegui piorar. Mas ficou bem próprio de vinte anos. O que estão achando?

Agüentei todos os tipos de provações para esconder minha verdadeira identidade. Toda vez que as pessoas olham para mim e falam "você parece o Renato Russo", algo grita muito forte no meu coração. E quando perguntam "e aí, Renato Russo?", eu dou uma risada tímida para esconder. Uma vez entrei em uma loja em São Caetano e, por coincidência, estavam tocando Vento no Litoral, uma de minhas músicas. Os vendedores começaram a se cutucar, e olharam para mim com um risinho escondido nas faces.

Fato é que estou ficando cada vez mais parecido comigo mesmo. Já me disseram isso. Tomei a decisão de contar a vocês porque o resultado das plásticas está se perdendo com a idade, o que fica ainda mais evidente quando deixo o cabelo crescer e me esqueço de fazer a barba mensalmente.

Tudo isso vai além da questão estética. Certo dia, de repente, comecei a dançar na sala. Minha mãe, ao perguntar se estava tudo bem, obteve como resposta "não olhe para mim! olhe para meus movimentos!". Quem me conhece, nota que estudo publicidade para disfarçar minha vontade de abandonar este mundo materialista. Dizem que tenho cara de USP e deveria estudar filosofia, letras ou artes cênicas por lá. Nego com a fala, mas não com os olhos. Acham que eu ficaria bem usando uma bata hindu, e mesmo que eu diga que ficaria ridículo, olho para o espelho e me vejo com uma delas. Não sei falar de amor e, droga, vivo dando conselhos amorosos! Por tudo isso, não havia mais como negar. A verdade logo viria à tona.

Então é isso, pessoal. Eu sou Renato Russo. Pronto, falei. Acreditem se quiser, estou pouco me fodendo para aqueles que vão achar isso uma piada de mal gosto.

Ah, que alívio! Chega de farsas, de modéstias, de uma imensa prisão no interior da minha alma. Como é bom estar de volta! Como é ruim saber que os Titãs não são mais os mesmos. Enfim. Vocês ainda cantam minhas músicas?

3 comentários:

david santos disse...

Olá, povo brasileiro!
Hoje você vai votar.
Vota bem, vota certeiro,
Se não quer vir a chorar,
Por votar no mais matreiro.

David Santos

Fernando A. Medeiros disse...

Ahahhhhhhh...

A confissão enfim veio, né, seu cantor! Lamento dizer que não sou muito fã de tuas músicas, meu caro, e que "Monte castelo" foi uma trucidação de apóstolo Paulo com um Camões ocasional. Para acoxambrar.

No entanto, fico feliz por estares vivo. Mas andes em segredo. Covers existem, mas nenhum que tenham a tua alma. Eis um elemento perigoso.

Anônimo disse...

Oi, eu sou a irmã do Grilo! vim aqui só pra confirmar que o episódio de São Caetano é verdadeiro! uhauhauha

Eu estava procurando um tecido pra encomendar uma saia na costureira, quando estramos numa loja para verificar se tinha o que eu queria. E de repente, lá estava os vendedores zuando da cara do meu irmão enquanto tocava na rádio uma música do Renato Russo que eu não lembro qual era.

Eu, minha tia e minha mãe (elas estavam junto) começamos a rir.

Tadinho do meu irmão... de Caio Blat pra Renato Russo, haja crises de identidade.