quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Sensações estranhas - Parte II: Telefone


por Cristiane Senn


Você é uma pessoa normal. Sai, se diverte, tem amigos, colegas, cumprimenta o cobrador do ônibus, a tia da cantina da faculdade, paga contas no banco, pede e dá informação, compra balas na banca – enfim, tudo, ou quase. A questão é que o contato pessoal acontece naturalmente na maioria das vezes, porque afinal os seres humanos precisam viver em sociedade ‘e talz’. Ok, tudo certo. Tudo bem. Tudo tranqüilinho. Jóia.
Só que aí você ouve aquele barulho, aquele ruído irritante e contínuo. A espinha estremece, os pêlos arrepiam, a mão sua, os olhos lacrimejam, os tímpanos doem, a cabeça dói, a necessidade de convivência em sociedade dói. Em uma palavra: TELEFONE.
Não existe nada pior do que a comunicação precisar ser mediada por uma coisa ao mesmo tempo fria e escandalosa como essa. O barulho, a situação de estar com um troço grudado no ouvido, a chance de você não ouvir direito e ter que perguntar de novo, ou de você ter que repetir tudo de novo, o “ouvir não vendo” – tudo isso transforma a ligação numa agonia. Pode-se alegar que na Internet, em que a comunicação é ainda mais artificial, as coisas correm mais naturalmente que na vida real. Claro. No e-mail, MSN, Orkut, blog, (mIRC! ICQ!) você não gagueja, não se engana, não tosse, não arrota, tem um Google à disposição pra não dizer besteiras (e ainda assim diz, mas, outro assunto) e se essas coisas acontecem, são propositais. Pode-se alegar que no contato direto as pessoas também não podem camuflar tais fatores, mas aí é vida real, e na vida real você pode simplesmente sorrir e belezura. O telefone é um meio-termo ingrato, você fala/ouve e não vê, não toca, não cheira. Não basta sorrir, tem que explicar. Todos os sentidos são cortados, resta apenas o ‘ouve aí’.
Pior, muito pior, é quando se está em situação de ter que ligar pra alguém. Depois de arranjar pequenas desculpas como tomar uma água, colocar o cadarço no tênis, checar os e-mails, enfim, procrastinar um pouco esse mini-pesadelo, você precisa ouvir o ‘tuuuu...’ contínuo, coração acelerando, sempre torcendo pra que a pessoa não atenda – e respirando aliviado quando ‘sua chamada está sendo encaminhada para a caixa de mensagens...’ (aqui é comum desligar o telefone, mas eu bem poderia descrever a situação de ter que deixar mensagens de voz, se a intenção fosse postar um conto de terror).

É uma pena que seja indispensável, e claro que no fim a gente acaba se acostumando. Mas quem nunca amaldiçoou Graham Bell no fundo do seu âmago? Operadoras de telemarketing, talvez.

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