sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Tempos bárbaros.

Por Heloísa Noronha.

Ultimamente, tenho evitado ler sites de notícias e assistir telejornais. Fico muito mexida quando sei de tragédias e desgraças – e a gravidez só vem acentuando essa sensibilidade. Mas, trabalhando como jornalista, fica meio difícil não acessar, pelo menos uma vez por dia, sites como UOL, Terra e IG. E foi em um deles (não me lembro qual) que ontem eu li rapidamente uma nota sobre uma tragédia que aconteceu na Marginal Pinheiros, perto da Ponte do Jaguaré – aliás, bem perto de onde trabalho. Na noite de quarta-feira um rapaz novinho, de uns 20 e poucos anos, parou o carro no acostamento para ajudar um homem (se não me engano, de um Ford KA) que estava com o carro quebrado. Enquanto descia do carro para prestar um raro e louvável ato de solidariedade, um caminhão veio com tudo e o atropelou, diante da namorada. O motorista do caminhão fugiu. O do carro quebrado – não sei como – também. Se o primeiro foi um monstro, o segundo deve ser chamado de quê?
O transporte público de São Paulo é uma merda. Ridículo. A cidade é imensa e a facilidade para se comprar um carro, hoje em dia, é excelente. Todo mundo quer ter um carro e todo mundo tem o direito de comprá-lo. É muito fácil, para candidatos como aquela tal sra. Soninha, mandar o povo andar de bicicleta. Queria ver quantos dias ela conseguiria pedalar de São Caetano do Sul até a Avenida Jaguaré. Nem vou discutir questões ecológicas, porque não tenho embasamento para tanto, nem me aprofundar tanto em assuntos que não conheço. Só queria desabafar que as pessoas, no trânsito, se transformaram em selvagens da Idade Média. E, tristemente, me incluo nesse grupo. Pego cerca de três horas de trânsito por dia e às vezes tenho vontade de deixar o carro no meio da rua e sair andando, de puro desespero. Lerdos, egoístas, distraídos, exibidos, folgados, estúpidos, cegos, burros, aproveitadores. Há todo o tipo de motorista por aí. Sim, concordo que muita mulher deveria estar mesmo pilotando fogão ou fazendo qualquer outra coisa para a qual tivesse um talento mínimo. E eu queria ver muito homem que se considera machão e bonzão no trânsito ajudar o Corpo de Bombeiros a recolher com a pá pedaços de corpos que sobram dos acidentes. E também assistir de camarote motoboy levando pontapés de coturno bem no meio do saco; pontapés com o mesmo impacto que eles usam para chutar retrovisores, portas e até pedestres (já vi isso no Centro de São Paulo) quando querem tirar uma fina ou passar um semáforo vermelho.
São Paulo, antes de metrôs e ônibus de Primeiro Mundo, precisa de educação, altruísmo, paciência. Até parados alguns motoristas são idiotas. No sábado passado, ao voltar do supermercado, meu marido deu de cara com um carro estacionado bem na porta da garagem do nosso prédio, bem diante de duas placas de “É proibido estacionar dia e noite”. Esperou o folgado retornar por alguns minutos. Nada. Não teve dúvida: deu ré e acelerou para cima do pára-choques do folgado, que, lógico, chegou e viu tudo. Saiu correndo, com o rabinho entre as pernas. Se achei bonito o que meu marido fez? Nem um pouco. Morro de medo de um desses playboys sair do carro com um 38 em punho. Se faria o mesmo em um momento de ira? Faria. Pois é, faria. Isso também já aconteceu comigo e pensei em riscar o carro do fulano com estilete. Ele chegou antes. O cansaço, o stress, a raiva e a sensação de onipotência que a atitude baixa e selvagem dos motoristas provocam vão contaminando a gente. Com as devidas proporções, lesar um carro de propósito, fechar alguém na curva e mandar um dedo médio pela janela é a ponta do iceberg que matou aquele menino na Marginal. Isso precisa parar.

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